sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Pastéis de massa tenra

Nas nossas conversas conjugais e gastronómicas de jantar de fim de semana, em que me esmero, chegamos sempre à conclusão de que temos experiências muito comuns, afinal da velha cultura gastronómica portuguesa, na variante burguesa, citadina, mesmo que de um lado e outro da linha equatorial. Vem isto a propósito de coisa muitas vezes lembrada, uma banalidade esquecida, mas que para ambos é uma grande memória das avós, os pastéis de massa tenra. Vem isto de hoje ter comido um, horroroso. Domingo vou-me desforrar. Amanhã não, porque já há outro programa, que logo verão.
A minha avó materna pontificava na cozinha, enquanto a minha mãe professava (salvo seja, quero dizer, trabalhava como professora). Por isto, a minha herança culinária é Fagundes, praiense, terceirense, mas com assimilação de muitas coisas boas, de raiz micaelense, da minha avó paterna, lado Viveiros. Entre elas, o polvo e o molho de fígado, famosos nas Capelas e redondezas, incluindo S. Vicente do retiro filosófico do meu querido amigo Jorge. E também os pastéis de massa tenra, que a tradição de família diz se deverem a uma esquecida criada Piedade.
Se a quiserem fazer, e não é nada difícil, aqui vai a minha receita familiar, afinal a geral mas com pequenos truques. 250 g de farinha, 4 c. sopa cheias (50 g) de banha, 1 dl de água, sal, um pouco de açúcar, a gosto. Se se quiser aligeirar, usar banha e manteiga, 2:1. Desde logo, na receita, como toque de diferença de receita familiar, a banha em exclusivo e o açúcar. Faz-se como uma massa quebrada, mas deve ser mais amassada, com o ponto importante de, no fim da mistura, se juntar parte da água muito fria. Depois, como em regra, embrulhar num pano e deixar repousar uma hora, no frigorífico. Também se trabalha a meio caminho como massa folhada, estendendo e dobrando, duas vezes (claro que sem juntar gordura).
O recheio, na minha casa e na da morena, era um moido de restos de carne assada ou guisada, refogada. Se não, com carne crua, compensar em temperos. Aqui vai uma sugestão, de compromisso.
500 g de carne de segunda (aba, acém, cachaço, chambão), 1/2 cebola, 1 dente de alho, 2 c. sopa de manteiga ou de margarina dietética, 2 c. sopa de farinha, 5 cl de vinho branco,  5 cl de leite, sal, pimenta preta moída a fresco, pimenta da Jamaica bem esmagada, tomilho a gosto, 1 raminho de salsa, atado.
Refogar a cebola e o alho, muito picados, com o louro. Juntar a carne moída em moinho de furos (!) e voltear bem, até bem alourada. Polvilhar com a farinha, até bem incorporada e alourada. Temperar e misturar o líquido, ferver a lume baixo deixando espessar muito grosso, mexendo sempre muito bem para não pegar ao fundo. Juntar goles de água, aos poucos, se necessário. Retirar o louro e a salsa. Estender muito bem a massa, cortar círculos grandes, rechear, fechar os pastéis, pincelar com gema de ovo e levar ao forno (pré-aquecido!), a 190º, 20-25 minutos. Deixar reduzir à temperatura de servir, no forno apagado, com a porta um pouco entreaberta.
O meu alter ego culinário, D, recomenda-me coisa que nunca fiz, mas que talvez fique muito bem. Reserva um pouco da carne, crua, para moer fino em misturadora de lâmina e acrescenta ao refogado de carne e à farinha, antes de prosseguir com a adição de líquido. Diz que a mistura de ambas as carnes resulta cremosa/granulada sem ficar borracha como se come por aí.

(Editado, 30.1.2011)

3 comentários:

  1. É na comparação que se percebe a diversidade e se enriquece! Irei, sem dúvida, ensaiar esta massa tenra que me é tão nova.
    Estes pastéis de massa tenra são totalmente distintos dos da minha tradição, introduzidos na família também por uma criada, alentejana de nome Virgínia, a minha querida Gina. Embora de composição qualitativa aproximada (os meus levam também azeite), têm uma feitura totalmente diferente, sendo uma massa extremamente trabalhada e sovada a permitir uma finura depois de frita só comparável aos coscorões.
    E não imagino como uma massa de pizza, que até é lêveda, possa substituir uma tenra, talvez por ser no forno e eu só conhecer os pastéis fritos. Imagino que devam ficar como as empanadilhas galegas.
    Se quiser ver as diferenças, estão em http://outrascomidas.blogspot.com/search/label/Past%C3%A9is%20de%20Massa%20Tenra e também em
    http://comidascaseiras.blogspot.com/search/label/Past%C3%A9is%20de%20Massa%20Tenra

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  2. LPontes, repare que chamo a atenção para que a massa é mais trabalhada (amassada ou sovada, como diz) do que a massa quebrada.

    Quanto à massa de pizza, foi uma dica que me deram. Não experimentei. A indicação é que só serve para pastéis feitos no forno, não fritos, e que a massa deve ser bem estendida.

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  3. O comentário de LPontes e a minha resposta acerca da massa de pizza perderam sentido com a edição do "post". Como tinha dito, tinham-me feito essa sugestão. Experimentei e não me agradou. Aproveitei a edição do texto para corrigir alguns pequenos erros que notei ao fazer hoje os pastéis.

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