quinta-feira, 17 de março de 2011

"Oh, simple things!"

Como já disse, isso é lema de um bom amigo, do Cão com pulgas, quando fala de coisas simplesmente simples, magnífica e simplesmente simples. Em cozinha, é o que mais há. Mas é preciso saber alguma coisa para se conseguir o simples, quando muita gente tem a ideia errada de que o bom é complicado. O grande truque é saber transformar o complicado em simples. Lembre-se o ainda saudoso Santí Santamaria.

Lembrei-me de escrever alguma coisa sobre isto por ter recolhido há pouco, no Pingo Doce aqui ao lado, um folheto muito bem feito, a cativar as donas de casa com pouca formação culinária mas que, tantas e tantas, querem um bom jantar de amigos, ou até dar prazer ao marido chegado a casa com mau humor. Caril de peru com coco e maçã, claro que com pó de caril, nada da minha esquisitice snob de fazer garam massala a fresco, na altura. Mas também nada de simplesmente juntar o pó, indica-se um truque simples mas muito bom para fazer a pasta de caril. Além disto, indicação simples mas correta de tempos e pontos de lume, mexer ou não, tapar ou não, coisas que as tias da blogosfera nunca indicam.

A seguir, muito bom, novamente descrito com simplicidade mas com rigor, uma espuma de lima com kiwi e raspas de chocolate preto, espuma, coisa não elementar, que as leitoras ficam a saber fazer mas que não aprendem na net. A questão é que quem fez este folheto, quem eu conheço bem, tem uma grande sabedoria gastronómica e é uma excelente cozinheira. Coisa de avós de netos cruzados que vão ser gastronomicamente exigentes. Com coisas destas ao dispor de milhares de clientes do supermercado, quem precisa das coisas deliciosas das corações e florzinhas?

Há um nível um pouco acima, mas hoje desadequado. Há muitos anos, comprei em Nova Iorque o excelente livro do chefe franco-americano Pierre Franey, "60-minute gourmet". Pensei fazer coisa do mesmo tipo, mas desisti, porque acho que era coisa datada. As receitas são muito simples, todas rápidas, mas de grande base clássica e francesa, a exigir técnica que não está no domínio da maioria das pessoas que quer essas receitas. Costeletas de carneiro salteadas, pouco fritas, com duxelles e molho Mornay (pág. 172) é certo que se faz em menos de uma hora, mas não é coisa de sair à pressão.

"Simple things" é também sempre o meu fim de semana, uma vez a meu cargo, outra a cargo de quem bem rivaliza comigo. Nada de complicado, porque há que gozar o descanso, mas coisas tão boas como, neste último, a cargo da morena, lombo de novilho coberto com chèvre e embrulhado em massa filo, com risoto de maracujá; ou camarões grandes temperados com leite de coco com caril suave, grelhados e acompanhados com endívias cozidas ao vapor. Receitas claro que não originais, das tais recolhidas em sítios de qualidade, não na net, e depois modificadas com um pouco de inspiração. Ou então, a meio da semana e como cozinha de solitário, um creme de legumes à poulette com almôndegas de carne.

Conselho final. Simples e bom é de quem sabe, como a minha amiga do Pingo Doce. Desliguem a net culinária e vão apanhar o folheto no supermercado.

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