sexta-feira, 21 de setembro de 2012

Salitre

Continuando com velhas técnicas de conservar e temperar, lembrei-me do salitre, componente das salmouras. É coisa descrita nos mais velhos tratados de cozinha e que eu comia bastante em jovem, principalmente a “língua escarlate”, coisa que a minha avó fazia muito bem mas de que nenhum dos netos herdou receita. Mas vai com muito mais, peças diversas de carne de vaca ou porco, mesmo peixe, principalmente do tipo salmão ou truta. Na Europa preparava-se, mas no Chile era um produto mineral de grande importância económica. Tem como componente nitratos. Lembram-se do velho "nitrato do Chile"?

O salitre tradicional é uma mistura de sal marinho e de nitrato de potássio, mais ou menos na proporção 10:1. Os nitratos andam hoje com muito má fama, como potencialmente cancerígenos, mas quem quiser arriscar pode comprar em qualquer drogaria ou roubar 50 g ao armário de reagentes do laboratório. Se for nitrato de sódio, que também se usa, é uma sobrecarga de sódio para a tensão arterial. Eu já fiz há tempos uma salmoura sem nitrato, só com sal (creio que foi um pernil de porco) e ficou muito bom. Não adquire é o tom escarlate. 

A base é 275 g de sal e 25 g de nitrato (ou só 300 g de sal) num litro de água, 30 g (2 c. sopa) de açúcar mascavado e condimentos a gosto. Quem recear que a lavagem final não elimine bem o sal e receie pela sua tensão arterial, pode descer a concentraçao total para 20% (200 g por litro). Há sugestões tradicionais para os condimentos (vejam o Escoffier). Base "obrigatória", pimentas, cravinho, louro, alho.

Para carnes, pimenta preta, zimbro, tomilho, louro, rodelas de aipo e cenoura. Para peixes, pimenta branca, salsa, um pouco de lascas de cogumelos, louro, um cálice de licor de anis, rodelas de cherovia. Claro que eu, micaelense, dou sempre um toque de malagueta, açaflor, temperos de S. Miguel.

Ferver, a dissolver e a tomar sabor dos temperos, deixar arrefecer e rejeitar o depósito de salitre não dissolvido. Limpar bem a peça de carne, bater ligeiramente com o rolo de massa e picar com uma agulha. No caso de peças grandes e rijas, usar uma seringa para injetar a carne no interior com a solução de salitre. Temperar com arte. Guardar uma semana. Lavar bem e cozer ou assar levemente, ou comer mesmo fria, sem mais cozinhado.

3 comentários:

  1. Sem dúvida inspirador! Guardar uma semana em que condições?

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  2. Sem que tenha razão especial para isso, deixo no frigorífico, assim como a malagueta enquanto está a curtir em sal. Mas creio que aguenta à temperatura ambiente, como era tradicional.

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  3. JVC
    Fui ao google ver a língua escarlate e encontrei aqui as dicas usadas pela minha mãe, que a cozinhava como ninguém!
    Ficava uma semana no frigorífico e nunca se estragou nenhuma.
    Quando sabia que eu lá ia, fazia-a sempre! Agora... acabou!
    Bom 2015

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