terça-feira, 8 de novembro de 2016

Estrelas

Já tenho ouvido coisas contraditórias e pouco abalizadas sobre classificações de restaurantes. Admito que também às vezes fico perplexo pelas disparidades de classificação, por exemplo entre o guia Michelin (estrelas) e os Top 50.
Que é tudo forjado e jogo de cumplicidades. Que se premeia a extravagância e a moda. Que só um bom cozinheiro percebe a diferença. Que muitas vezes não compensa a relação preço/qualidade. Não creio em nada disto, e muito menos na afirmação de que isto só é coisa para quem sabe de técnica culinária. É tão verdade como ser necessário saber muito de técnica operática para se distinguir especialmente Plácido Domingo ou Jonas Kaufmann. É só questão, neste caso, de se saber optar, por mero gosto, entre cantores de bel-canto e “spinto". Bom gosto e bom senso.
Há semanas, na nossa breve digressão a Londres, tínhamos prometido ao nosso querido jovem casal anfitrião irmos a um bom restaurante, extravagância que bem merece economizarmos cá em ir a restaurantes banais e tentar cozinhar bem em casa.
Os de três estrelas estavam esgotados e fomos a um biestrelado, o Marcus, no Hotel Berkeley, com chefia de Marcus Wareing.
De regresso, festejámos poucos dias depois o meu aniversário num restaurante lisboeta recente que anda muito falado, o Trio, pela originalidade e qualidade da sua cozinha. Não é muito “fair” (já que vim de Londres) criticá-lo, mas hei de fazê-lo, por estar bem presente o Marcus.
Quem tiver esta experiência comparativa nunca mais pode dizer o que exemplifiquei acima. São coisas que só um “come por comer” não vê: a qualidade e frescura dos produtos, a leveza, a subtileza dos sabores, a harmonia dos contrastes, a “sonoridade” exata do prato, até o ritmo do serviço. E não é preciso nenhuma extravagância. Em Inglaterra, por exemplo (e fora, um pouco, o caso de originalidade bem fundamentada de Heston Blumenthal) o que ainda vale é a base francesa da chamada “cozinha europeia moderna”. 

É também o que vi, noutra ocasião, no único restaurante três estrelas que conheço (a convite, claro!), vizinho do Heston, o Waterside Inn, em Bray. Por exemplo, uma entrada “oh, simple thing!”, de carne de pinças de lavagante, espargos verdes, caviar de cultura e espuma de nata com vodka. Tentei reproduzir em casa a cor, o brilho e a textura daqueles espargos mas só me aproximei. É o que faz a diferença para as estrelas.

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